Pare de medir tarefas e comece a usar métricas que realmente importam
A ilusão da produtividade: por que completar tarefas não é o mesmo que criar valor
Você já parou pra pensar por que acompanhamos tantas métricas no desenvolvimento de software? Story points, burndown charts, velocidade de sprint... E no final do trimestre, a pergunta que ninguém quer ouvir chega:
"Cadê o retorno de todo esse esforço?"
Nos últimos anos, trabalhei em diferentes equipes de produto. Vi times orgulhosos por completar 100% dos story points na sprint enquanto o produto que construíamos mal era usado. Outros times nem acompanhavam pontos, mas entregavam features que os usuários adoravam.
A diferença? O segundo grupo media o que realmente importa.
✨ O que esperar do artigo
Por que métricas focadas em tarefas podem te levar para o caminho errado
Quais métricas realmente mostram o valor que você está criando
Como identificar se você está no caminho para o product-market fit
Estamos medindo as coisas erradas
Comecei minha carreira obcecado com pontuações de sprint. Nosso time celebrava quando "queimávamos" todos os pontos. Tínhamos gráficos lindos nas retrospectivas.
Mas quando os investidores perguntavam sobre crescimento de usuários ou receita, o clima mudava.
O problema? Estávamos medindo nossa atividade, não nosso impacto.
Recentemente, uma pessoa engenheira de uma empresa grande (mais de 5 mil funcionários) me contou algo alarmante: seu time gastava entre 1-2 horas, por pessoa, por semana, em reuniões apenas para estimar e medir tarefas. Isso equivale a mais de 5% de todo o tempo produtivo do time!
O pior? Nada concreto era feito com esse esforço. Era basicamente uma grande perda de tempo e energia cognitiva para o time inteiro. No fim do dia, nenhum cliente se importava se eles tinham gráficos de burndown perfeitos.
Este é um exemplo clássico da Lei de Goodhart: "Quando uma métrica se torna um objetivo, ela deixa de ser uma boa métrica." Times começam a otimizar para completar story points, não para entregar valor real.
Concluir tarefas não significa entregar valor. É duro de ouvir, mas precisamos aceitar: ninguém se importa com quantos story points você completa. O que importa é o resultado.
A boa notícia? Você não precisa jogar fora as estimativas. Elas têm seu lugar.
Estimativas são para previsibilidade, não para medir sucesso
Estimar tasks ajuda a evitar surpresas. Quando seu PM pergunta quando uma feature estará pronta, você precisa de alguma base para responder.
Mas não confunda estimativas com métricas de sucesso. São ferramentas diferentes para propósitos diferentes.
Use estimativas para planejar e evitar surpresas, não para medir desempenho.
E lembre-se de planejar para os desconhecidos que você irá descobrir ao longo do caminho.
As métricas que realmente deveríamos acompanhar
Se story points e burndown charts não mostram valor real, o que deveríamos medir? Baseado na minha experiência, estas são as métricas que realmente importam:
1. Tempo para o mercado (Time to Market)
Não acompanhe apenas a velocidade da sprint. Meça quanto tempo leva para uma ideia chegar às mãos dos usuários.
Imagine um time que conclui todas as suas stories dentro da sprint, mas demora três meses para lançar uma feature completa. Os usuários esperam, a competição avança, e oportunidades são perdidas. Se você reduzisse o escopo inicial e entregasse em ciclos menores, poderia obter feedback mais cedo e ajustar o curso conforme necessário.
Se todos os seus projetos consistentemente demoram mais de 6 semanas, algo está errado. Talvez você esteja tentando resolver problemas grandes demais de uma vez.
2. Taxa de adoção de features
A feature que você passou semanas construindo está sendo usada? Por quantos usuários? Com que frequência?
Pense em um time que trabalhou dois meses em um novo painel de relatórios avançados. O trabalho foi tecnicamente impecável e todos os story points foram concluídos no prazo. Um mês depois do lançamento, os dados mostram que apenas 3% dos usuários acessaram a funcionalidade. Foi realmente o melhor uso do tempo do time?
Esta métrica força a reflexão sobre priorização e entendimento real das necessidades dos usuários.
3. Retenção de usuários
Os usuários continuam usando seu produto ao longo do tempo? A taxa de retenção é a métrica mais honesta que você terá.
Considere um time que otimizou a performance do app principal, reduzindo o tempo de carregamento em 40%. Em vez de medir apenas a conclusão da tarefa, eles acompanharam a retenção de novos usuários nos 30 dias seguintes. A retenção subiu 15% – um sinal claro que o trabalho teve impacto real no negócio.
O santo graal: Product-Market Fit
Quando trabalhamos com métricas de resultado em vez de métricas de atividade, estamos realmente perseguindo algo maior: o Product-Market Fit (PMF).
O PMF acontece quando:
Sua retenção se estabiliza (não cai indefinidamente)
O crescimento se torna mais orgânico
Os usuários ficariam muito desapontados se não pudessem mais usar seu produto
Se você quiser checar se tem PMF, faça a pesquisa do Sean Ellis: "Como você se sentiria se não pudesse mais usar [nosso produto]?"
Se mais de 40% responderem "muito desapontado", você está no caminho certo.
Mudando o foco do seu time
Como fazer essa transição na sua equipe? Comece com estas perguntas simples:
Por que estamos construindo isso? Fuja de respostas como "porque estava no roadmap". Busque entender qual problema real do usuário você está resolvendo.
Como saberemos se foi bem-sucedido? Defina antecipadamente qual métrica de resultado você espera melhorar.
Quanto tempo vai levar até estar nas mãos dos usuários? Se a resposta for "meses", veja se consegue quebrar em entregas menores.
Essas perguntas mudam o foco de "estamos completando nossas tarefas?" para "estamos entregando valor real?".
Um padrão que descobri
Startups que crescem rapidamente têm algo em comum: raramente falam sobre story points em reuniões de liderança. Elas discutem aquisição, retenção, receita e feedback de clientes.
Enquanto isso, times estagnados frequentemente mostram burndown charts perfeitos em retrospectivas, enquanto evitam discutir métricas de negócio.
A correlação é clara: times que focam em resultado superam times que focam em atividade.
Não significa abandonar o Agile
Os métodos ágeis trazem valor quando usados corretamente. A questão é: para quais métricas você dá mais atenção?
Se você está gastando horas em cerimônias para estimar tarefas (e em outros rituais), pergunte-se: isso é importante para seus clientes? O que aconteceria se você reduzisse esse tempo pela metade e investisse a diferença em conversar diretamente com usuários?
Como bem destacado no Pragmatic Programmer, ao longo do tempo, "ágil" deixou de ser um adjetivo para se tornar um substantivo. "Ah, aqui na empresa usamos o Ágil/Scrum/Kanban para entregar software." Isso é um erro fundamental. Ágil é como você faz as coisas, não uma coisa em si.
Ágil nunca foi sobre seus rituais. Era sobre responder a mudanças, colaborar com clientes e entregar software funcionando com frequência.
O manifesto ágil menciona "indivíduos e interações acima de processos e ferramentas", mas muitas empresas inverteram isso completamente.
Como começar hoje mesmo
Mudar o foco de métricas de atividade para métricas de resultado não acontece da noite pro dia. Aqui estão cinco passos práticos que você pode começar a implementar imediatamente:
1. Faça um diagnóstico rápido
Reserve 30 minutos para responder a estas perguntas:
Quanto tempo seu time gasta em cerimônias de estimativa por semana?
Qual foi a última feature que vocês lançaram? Quantos usuários a adotaram?
Vocês sabem qual é a taxa de retenção atual dos usuários?
Se você teve dificuldade para responder às duas últimas, provavelmente está focando demais em métricas de atividade.
2. Comece pequeno com uma feature
Na próxima feature que seu time for desenvolver:
Antes de iniciar, defina com o time: "Como saberemos se esta feature teve sucesso?"
Escolha uma métrica de resultado específica (ex: "30% dos usuários ativos usarão esta feature pelo menos uma vez por semana")
Configure o tracking necessário para medir isso antes mesmo de começar a codificar
3. Introduza uma "Revisão de Resultados"
Se seu time faz retrospectivas, adicione um item fixo na agenda:
5 minutos para revisar métricas de atividade (se ainda for necessário)
15 minutos para revisar métricas de resultado das features recentes
Discutir: "O que aprendemos sobre nossos usuários desde a última reunião?"
4. Simplifique o processo de estimativa
Se seu time gasta muito tempo estimando:
Experimente usar apenas 3 tamanhos: pequeno, médio e grande
Limite o tempo de estimativa a no máximo 10 minutos por sprint
Ou seja mais radical: experimente uma sprint sem estimativas e veja o que acontece
5. Compartilhe histórias de sucesso
Quando uma feature tiver bons resultados:
Compartilhe amplamente com a empresa, focando no impacto para o usuário, não no esforço
Dê crédito às pessoas que mediram e otimizaram para resultados, não apenas para completar tarefas
Use isso como exemplo para reforçar a importância de métricas de resultado
Quando cheguei no PostHog, percebi que a empresa já operava com essa mentalidade. Desde o início, as discussões raramente eram sobre estimativas. Em vez disso, o foco estava sempre em se a feature resolveria o problema do usuário da melhor forma possível.
Além disso, essa é uma excelente maneira de melhorar o seu currículo. Focando nos resultados que o seu trabalho teve, ao invés das suas responsabilidades.
🌟 Resumo
Métricas de atividade (story points, burndown) raramente justificam o esforço que exigem e podem distrair do que realmente importa
Estimativas têm seu lugar, mas como ferramenta de comunicação, não como medida de produtividade ou sucesso
Foque em métricas de resultado:
Tempo para o mercado (quanto tempo leva do conceito ao lançamento)
Taxa de adoção de features (os usuários realmente usam o que você constrói?)
Retenção de usuários (eles continuam voltando?)
Comece a mudança hoje mesmo com pequenos experimentos no seu processo atual
O Product-Market Fit é o objetivo final – quando você o atinge, o trabalho de aquisição e crescimento fica muito mais fácil
Lembre-se que "ágil" é como você faz as coisas, não uma metodologia rígida a ser seguida cegamente
Lembre-se: ninguém usa seu produto porque você completou todos os story points da sprint. Eles usam porque você resolveu um problema real para eles. Meça o que realmente importa.
📚 Referências e leituras adicionais
Fico feliz que você leu o artigo até o final! 🙏
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