Senior de 3 anos vs pleno de 10 anos: qual é você?
Por que tempo de experiência não garante senioridade (e o que fazer para mudar sua trajetória)
Desde que comecei a publicar conteúdo, tive a oportunidade de conversar com centenas de desenvolvedores brasileiros. E um padrão ficou claro: existem dois perfis que geram debate constante em nossa indústria.
O primeiro é o "senior de 3 anos" - aquele dev que, com pouco tempo de carreira, já lidera projetos complexos e ganha salários que muitos veteranos sonham. O segundo é o "eterno pleno" - profissionais com 10+ anos de experiência que ainda não conseguem liderar projetos de forma independente.
Hoje vou contar duas histórias que ilustram esses perfis. São composições baseadas em dezenas de conversas reais, e revelam uma verdade desconfortável: tempo de carreira não é sinônimo de senioridade.
✨ O que esperar do artigo
Por que algumas pessoas alcançam senioridade com poucos anos de carreira
O que realmente define senioridade em empresas de tecnologia modernas
Como escolhas de carreira podem abrir ou fechar portas no futuro
A história de Laura: 3 anos até senior
Laura entrou como estagiária no Nubank enquanto cursava Ciência da Computação. No começo, mal conseguia completar tarefas sem ajuda. Mas ela tinha algo valioso: acesso a mentores em posições acima dela.
Seu primeiro ano foi intenso. Cada PR era uma aula. Cada code review, uma oportunidade de aprender. Com 8 meses, já resolvia bugs sozinha. Com 1 ano, foi promovida a pleno no primeiro ciclo de performance.
No segundo ano, Laura mudou sua abordagem. Em vez de apenas entregar tarefas, começou a entender o contexto maior:
Quais métricas importavam pro negócio?
Por que certos incidentes aconteciam repetidamente?
Como diferentes componentes do sistema se conectavam?
Ela se tornou a pessoa que fazia onboarding de novos membros. Quando surgiu um projeto envolvendo três times, se voluntariou. Foi um caos de reuniões, alinhamentos e retrabalho. Mas ela aprendeu algo crucial: a complexidade de coordenar pessoas é maior que a complexidade técnica.
O momento da virada
No terceiro ano, Laura liderou um projeto crítico envolvendo duas organizações diferentes. O sistema de pagamentos precisava ser refatorado sem afetar milhões de transações diárias.
Ela não era a pessoa mais técnica do time. Mas era quem melhor entendia as implicações de cada decisão. Quando deu problema em produção (e deu), ela liderou o post-mortem. Transformou o incidente em documentação que preveniu erros futuros.
Seu manager começou a confiar nela completamente. Qualquer tarefa na mão de Laura tinha duas garantias:
Seria entregue
Riscos seriam comunicados cedo
Com 3 anos de empresa, foi promovida a senior. O motivo? Ela já atuava como uma:
Expert no domínio do seu time
Referência técnica em partes críticas do sistema
Mentora de outros desenvolvedores
Dona de projetos complexos do início ao fim
A história de João: 10 anos no mesmo lugar
João começou sua carreira numa consultoria conhecida. O salário inicial de R$5 mil parecia ótimo na época. O trabalho era previsível: projetos de 6 meses, sempre usando a mesma stack.
Depois de 4 anos, trocou para outra consultoria. Aumento de 60% no salário! Agora ganhava R$8 mil. Mas o dia a dia não mudou muito. Continuava implementando CRUDs, integrando APIs, fazendo deploys manuais.
Com 6 anos de carreira, foi para uma multinacional. Novo aumento: R$12 mil. Mas havia um padrão:
Sempre trabalhava em projetos temporários
Nunca via o impacto de longo prazo do seu código
Não participava de decisões arquiteturais
Trocava de contexto antes de dominar o domínio
A armadilha da especialização limitada
João se tornou especialista numa tecnologia específica - digamos, Oracle Forms. Era difícil encontrar pessoas com esse conhecimento. Isso garantiu mais um aumento: R$20 mil com 10 anos de carreira.
Parece uma história de sucesso, certo? Até você considerar:
Seu conhecimento é valioso apenas em empresas específicas
Não desenvolveu habilidades de liderança técnica
Nunca precisou tomar decisões arquiteturais complexas
Não tem experiência mentorando outros devs
Hoje, com 10 anos de experiência, João ganha R$20 mil. Mas suas opções são limitadas. Poucas empresas precisam de especialistas em Oracle Forms. E as que precisam não pagam muito mais que isso.
O contraste revelador
Laura, com 3 anos de carreira:
Salário: R$18 mil + R$100 mil/ano em ações
Total efetivo: ~R$26 mil/mês
Pode trabalhar em qualquer empresa de tech
Recebe convites para processos pelo LinkedIn pelo menos 2x por mês
João, com 10 anos de carreira:
Salário: R$20 mil
Sem equity
Limitado a empresas com stack específica
Precisa procurar ativamente por vagas
A diferença não está só no dinheiro. Laura tem mais opções. Ela desenvolveu habilidades transferíveis:
Resolver problemas ambíguos
Liderar projetos complexos
Mentorar outros engenheiros
Tomar decisões de arquitetura
Comunicar com stakeholders
Como discutimos sobre salários trimodais, empresas tier 2 e tier 3 valorizam essas habilidades muito mais que anos de experiência.
O que realmente define senioridade?
Empresas modernas de tecnologia não medem senioridade por anos de experiência. Como explorei no artigo sobre o que aprendi ao não ser promovido para sênior, elas procuram:
1. Capacidade de lidar com ambiguidade
Senior engineers recebem problemas, não soluções. "Precisamos reduzir o tempo de checkout em 30%" é diferente de "implemente este botão aqui".
2. Visão além do código
Entender como decisões técnicas impactam o negócio. Por que estamos construindo isso? Qual o custo de não fazer? Existem alternativas mais simples?
3. Multiplicador de força
Um senior torna o time inteiro mais produtivo. Através de mentoria, documentação, arquitetura bem pensada e processos eficientes.
4. Ownership de longo prazo
Não é só entregar e sumir. É acompanhar métricas, corrigir problemas, evoluir a solução conforme o negócio cresce.
Como acelerar sua trajetória: exemplos práticos
Se você se identifica mais com João, não se desespere. O jogo não acabou. Aqui estão ações práticas com exemplos reais:
Situação 1: "Estou preso em tarefas repetitivas"
Exemplo: Maria passa 80% do tempo corrigindo bugs e fazendo pequenas alterações. Nunca trabalha em features novas.
Solução prática:
Automatize o repetitivo: Crie scripts para tarefas recorrentes
Documente padrões: Escreva um guia de "bugs comuns e soluções"
Proponha melhorias: "Percebi que 30% dos bugs vêm do módulo X. Posso refatorá-lo?"
Conversa com o manager: "Notei que gastamos 15 horas por sprint em bugs do sistema de autenticação. Posso dedicar uma sprint para refatorar e reduzir isso para 3 horas?"
Situação 2: "Não tenho mentores na empresa"
Exemplo: Carlos trabalha numa empresa pequena onde ele é o dev mais experiente.
Solução prática:
Mentoria externa: Participe de comunidades online, como a nossa comunidade de assinantes
Open source: Contribua para projetos grandes onde terá code reviews de seniors
Aprenda em público: Escreva sobre o que está aprendendo
Situação 3: "Quero liderar projetos mas não me dão oportunidade"
Exemplo: Ana tem 5 anos de experiência mas nunca liderou um projeto do início ao fim.
Solução prática:
Comece pequeno: "Posso ser o ponto focal dessa integração com a API do parceiro?"
Escreva design docs: Mesmo que não peçam, documente suas propostas
Seja proativo em reuniões: Lidere discussões técnicas
Template de proposta: "Identifiquei uma oportunidade de melhorar nossa performance em 40%. Escrevi um documento com a proposta técnica. Posso apresentar pro time e liderar a implementação?"
Situação 4: "Minha empresa não tem projetos desafiadores"
Exemplo: Pedro trabalha mantendo um sistema legado sem perspectiva de modernização.
Solução prática:
Crie seus desafios: Implemente testes onde não existem, melhore performance
Projetos paralelos: Não seja um dev de tutoriais - construa algo real
Prepare sua saída: É hora de considerar uma mudança
Escolha ambientes de crescimento
Como explorei no artigo sobre Startups vs Scaleups vs Big Techs, cada tipo de empresa oferece oportunidades diferentes:
Para acelerar senioridade, procure:
Empresas com mentores em posições mais altas
Projetos com impacto real no negócio
Autonomia para tomar decisões
Feedback constante e direto
Desenvolva T-shaped skills
Seja profundo em uma área, mas tenha conhecimento amplo:
Exemplo prático de João (o pleno de 10 anos):
Atual: Especialista em Oracle Forms
Meta: Especialista em backend + conhecimento de frontend e infra
Plano de 6 meses:
Mês 1-2: Aprenda o essencial do frontend (2h/semana)
Mês 3-4: Implemente um side project fullstack
Mês 5-6: Adicione CI/CD e monitoria ao projeto
Isso já o diferencia de 90% dos especialistas em Oracle Forms.
Meça e comunique impacto
Crie um brag document e atualize semanalmente. Mas não apenas liste tarefas - quantifique resultados:
Ruim: "Implementei nova funcionalidade de relatórios"
Bom: "Implementei sistema de relatórios que reduziu tempo de análise de 2h para 15min, economizando 30h/mês pro time de vendas"
A verdade sobre mudanças de empresa
Por que engenheiros mudam de emprego? Às vezes é a única forma de acelerar crescimento. Mas cuidado:
Mudança produtiva (como Laura poderia fazer):
De empresa tier 2 para FAANG
De produto para plataforma na mesma empresa
Para liderar um time em startup
Mudança improdutiva (como João fez):
Mesma função em empresa similar
Foco apenas em aumento salarial
Sem considerar aprendizado
O que fazer a partir de segunda-feira
Avalie honestamente: Você está mais pra Laura ou João?
Identifique gaps: O que falta para o próximo nível? Use este framework
Crie um plano:
Curto prazo (3 meses): Uma habilidade nova
Médio prazo (6 meses): Liderar um projeto
Longo prazo (1 ano): Posição de maior impacto
Execute com disciplina: Como discutido em 18 dicas para se destacar
Documente tudo: Seu progresso, aprendizados, impacto
🌟 Resumo
Tempo de experiência ≠ senioridade: 10 anos fazendo a mesma coisa não te fazem senior
Ambiente importa mais que anos: Escolha empresas que te desafiem e ofereçam mentoria
Senioridade é sobre impacto: Não é só código limpo, é resolver problemas de negócio
Habilidades transferíveis abrem portas: Invista em competências que funcionam em qualquer empresa
O caminho mais rápido nem sempre é trocar de empresa: Às vezes é se destacar onde você está
Ação beats intenção: Comece pequeno, mas comece hoje
Lembre-se: construir uma carreira sustentável é uma maratona, não um sprint. Mas isso não significa que você precisa levar 10 anos pra chegar onde quer.
Fico feliz que você leu o artigo até o final! 🙏
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